Um escritor brasileiro de renome, um jovem actor de novelas, um padre do país profundo. Todos eles foram clientes da call girl mais requisitada do país. Paula Lee vende o corpo, e chega a cobrar 500 euros por hora, mas já lhe pagaram cinco vezes mais.
Os seis telemóveis não param de tocar no quinto andar de um condomínio privado com vista para a baía de Cascais. A vibração dos aparelhos topo de gama disfarça o pico de adrenalina que percorre a sala, já na penumbra. É uma sexta-feira especial. Paula Lee e Elizabeth anunciaram há poucas horas nos seus sites que estão disponíveis, até à meia-noite, para o clássico fetiche masculino: ménages à trois. Só atendem os números de habitués, silenciando a maioria das duzentas chamadas que irão receber até ao final do dia.
Do outro lado da linha, ouvem-se vozes ansiosas, que, com mais ou menos rodeios, perguntam pela tabela de preços, o horário dos serviços, e até as regras do jogo a três. Por menos de 600 euros elas não despem os tops, vestidos justos e botas de cano alto. "Nenhum encontro fica definido apenas com um telefonema", revela Paula, uma das poucas acompanhantes de luxo em Portugal a recorrer ao seu site pessoal para conhecer melhor os pretendentes. "Depois de sentir que são dignos de confiança, dou-lhe uma password para entrarem na minha página fechada", explica. A troca de e-mails, SMS e telefonemas que se segue é determinante para fazer, ou não, a marcação do serviço. "Recuso muitos clientes. Às vezes apenas pelo feeling."
A brasileira de 27 anos começou por baixo no submundo da noite. Foi prostituta nos bordéis de Bragança e Leiria. Hoje é a acompanhante de luxo mais requisitada do país. Chega a cobrar 500 euros por hora e já ganhou 2500 euros de um cliente mais generoso. "Não aprecio one night stands, gosto de construir relações a longo prazo e se algo não me agrada num homem, livro-me dele, com diplomacia", define-se.
Actualmente, tem seis clientes regulares - um deles deposita-lhe o dinheiro na conta bancária antes do início de cada mês. "Nenhum homem me compra a vontade. Se me quer, tem de aprender a conquistar-me." Esta filosofia pode ser desconcertante para uma mulher que ganha a vida com o corpo, mas o perfil de Paula Lee vai contra todos os estereótipos: colecciona livros de Henry Miller e Gabriel García Márquez, sabe de cabeça os poemas do Vinicius de Moraes, e o seu blogue, 'Amante Profissional', é muito procurado na Net. A fama atrai intelectuais para a sua enorme cama em tons de vermelho. Há pouco tempo, um escritor brasileiro de renome, que escreve sobre sexo, veio a Lisboa e pagou pelos seus serviços. "Estava com uma grande expectativa pois é uma das pessoas que eu e a minha mãe mais endeusamos", conta. O cliente revelou-se, porém, menos inspirado na cama do que nas prosas de cariz erótico. "Foi mau. Uma decepção. Se a minha mãe soubesse...", ironiza.
Conturbado é o adjectivo mais apropriado para definir a recente 'visita' de um actor de novelas que passa a vida nas páginas da imprensa cor-de-rosa. O rapaz sentiu-se "humilhado" quando se apercebeu de que Paula Lee não o reconhecia de lado nenhum. "Ainda pensei que fosse o homem do talho. E disse-o na cara", afirma sem ironias. Quando ele se foi embora, ainda irado, ela foi pesquisar na Internet e lá encontrou informações sobre a jovem vedeta de televisão. "O currículo dele não me impressionou..."
Foi numa igreja que deu de caras com um dos clientes mais misteriosos nos seis anos de profissão. 'Carlos', nome fictício, mal abriu a boca antes, durante e depois do acto sexual. Ela ainda julgou que se tratava de um polícia quando lhe perguntou pela profissão. O cliente ficou apático e desconfiado, a olhar para ela e remeteu-se ao silêncio. "Senti o corpo dele a gelar." Umas semanas mais tarde foi à missa e lá estava 'Carlos' no altar a pregar a fé do Senhor. Paula Lee tem uma regra: nunca fala a um cliente se o vir casualmente, mas naquela manhã de domingo resolveu abrir uma excepção. "Não sei o que me deu mas entrei na fila e fui comungar." Ainda hoje se recorda com nitidez da expressão de espanto e receio quando o padre se apercebeu de quem estava entre o seu rebanho. "Devia pensar que eu o iria chantagear." Enganou-se. A brasileira nunca mais frequentou uma missa, embora tivesse sido catequista no Brasil. "Venho de uma família de evangélicos. Se eles soubessem o que eu faço seria o fim do mundo", enfatiza.
Paula perdeu a conta do número de homens com quem teve sexo e, mais do que um sexólogo, tem legitimidade para teorizar sobre o comportamento dos portugueses debaixo dos lençóis. Boas notícias para os visados. "A maioria é boa na cama." Ao contrário de uma prostituta endurecida pela rua, ela faz questão de ter prazer. Antes ainda disfarçava. Mas apercebeu-se de que fingir orgasmos era mais difícil do que tê-los, na realidade. "Estar lubrificada tem vantagens: o acto é menos doloroso e o preservativo não se rompe." Há uma regra sagrada: o orgasmo depende mais dela do que do cliente.
Paula Lee não é conhecida no meio por ser violenta na cama e não aprecia, por aí além, números excêntricos. Só uma vez enveredou pelos requintes sado-masoquistas. "Achei horrível estar a pisar o pénis com saltos de sapatos e ver que o cliente tinha prazer com aquilo." Participou, também uma vez, numa orgia com oito homens. "É mau. Há um ou dois de quem se gosta mais e os outros só ali estão a atrapalhar." Ainda hoje não percebeu qual a sua posição sexual favorita. "Bem, estar por cima é
bom..."
As mulheres também a procuram - ela assume-se como bissexual - mas regra geral, após o primeiro contacto, não voltam a ligar. A acompanhante explica-lhes que só actua com preservativo, mesmo no sexo oral. "Elas não compreendem. Ao contrário dos homens, a ideia da 'borrachinha' faz-lhes confusão." Não tem dúvidas de que a crise económica está a incentivar o sexo desprotegido na profissão. "As novas acompanhantes, desesperadas por arranjar dinheiro, cedem aos desejos mais perigosos dos clientes que não querem preservativos." Mesmo sem dados objectivos à mão, ela estima que 60% das meninas pisam o risco, contra as 25% de há cinco anos.
Os perigos da profissão são mais do que muitos, mas Paula tem escapado ilesa. "Fui agredida uma vez, em Leiria. Mudei-me para Lisboa depois desse episódio." Quando desconfia de um cliente, contrata um segurança, que fica plantado à porta de casa, em Benfica. E nunca atende depois das dez da noite. São as vicissitudes de trabalhar por conta própria, sem os intermediários do costume. "Há colegas que acham mais seguro os hotéis de luxo. Eu prefiro a minha casa, pois da janela do meu quarto vejo bem a minha praceta e controlo quem chega. Se não gostar do aspecto, desmarco."
A brasileira tem um namorado há três anos. Garante que nunca lhe foi infiel. Ele sabe desde o início da relação como ela ganha a vida. "Tentou convencer-me a sair da profissão. Em vão. Mesmo que ele fosse muito rico não o faria." Não é porque o faça por gosto ("largava isto já amanhã") mas porque o dinheiro lhe dá jeito no futuro. "Ganho muito bem. Dá para estar um mês parada. Se estiver, por exemplo, deprimida ou com uma dor de cabeça, não atendo."
Pasme-se. O dia-a-dia desta acompanhante de luxo não é muito diferente do de uma comum funcionária pública. Não é viciada no cabeleireiro ou na manicura, nem em cremes hidratantes topo de gama. Usa o comum Vasenol, muito elogiado pelos clientes, por sinal. No trabalho, prefere o clássico Chanel n.º 5, um perfume neutro, que não compromete os clientes quando chegam a casa e se deitam ao lado da esposa. O corpo, aparentemente em forma com o ioga, não pede qualquer tipo de cirurgia estética. "Mamas de silicone? Botox? Não. Sinto-me bem assim. Até porque nunca ninguém reclamou", ironiza.
Paula Lee está a escrever uma peça de teatro inspirada nos momentos mais cómicos da sua profissão. Histórias não faltam: desde o cliente de peruca que durante o acto se descolou da cabeça, devido ao suor, e ela tentava, discretamente ajeitar para ele não ser gozado na rua quando saísse. Até à de um rapaz de 17 anos, a quem ela pediu o bilhete de identidade e o aconselhou a aparecer no dia seguinte, pois era o dia em que fazia 18 anos e ela não atende menores. Já não falando dos homens virgens aos 35 e aos 42 anos, tão inexperientes na cama como uma criança de 12 anos.
"Infelizmente já tive também casos dramáticos", desabafa. Encontrar um cliente com um facalhão apontado à barriga, ameaçando matar-se por não ser correspondido no amor, é dose cavalar, até para quem viu um pouco de tudo nas casas de alterne do Norte e do Centro do país. "Pediu para ir à cozinha para beber um copo de água. Estranhei a demora. Quando ouvi a gaveta dos talheres a abrir-se, saí da cama e encontrei-o naquele espectáculo", conta. Paula sabia que a faca não estava afiada. Para o impressionar, pegou nela pela serrilha, e sem se magoar, tirou-a das suas mãos. "Expulsei-o logo de minha casa", resume. Um outro homem escreveu-lhe uma carta de suicídio pelas mesmas razões: sentia uma paixão exacerbada pela ex-prostituta. Mas não se matou. "Fazem-no para me chamarem a atenção." É a carência afectiva que os leva a actos tão extremos? "Tento que não criem expectativas elevadas sobre mim."
Entre as quatro paredes do seu quarto entranhado pelo aroma do incenso é a amante profissional quem dita as regras do jogo. Um dos clientes mais antigos, com quem vai para a cama há quatro anos, exigiu no primeiro encontro um enorme espelho atrás da cama para poder assistir ao acto. A brasileira recusou. Queria também gravar no telemóvel os episódios mais hardcore. Nova nega. A intimidade foi crescendo entre o 'casal' e dois anos depois ela fez-lhe uma surpresa. Colocou um espelho no quarto. "A iniciativa foi minha. Ele fez por merecê-lo." Já as imagens no aparelho 3G continuam a ser vetadas. "Não posso correr o risco de ver o meu rosto a circular pela Internet", explica.
Os mitos da profissão teimam em perdurar no tempo. "Quando uma acompanhante de luxo diz não ter relações sexuais com grande parte dos seus clientes está a mentir." Assegura que as colegas de profissão pretendem passar essa ideia para não serem confundidas com as vulgares prostitutas de rua. "Só 1% dos homens me procura apenas para conversar." O sexo pode não surgir logo no início, mas o jogo da sedução termina invariavelmente na cama. Curiosamente, aprecia que eles lhe mostrem as fotografias da mulher e dos filhos ou que revelem pormenores da vida íntima. E chega a ir lanchar ou ao cinema com muitos deles, pois rejeita a tese de mulher-objecto. Outro mito recorrente no meio? O de que os homens com um pénis grande dão mais prazer. "Nada mais errado. Prefiro-os pequenos." Paula Lee chega ao ponto de rejeitar novos encontros com clientes com uma anatomia sexual acima da média. A noite no condomínio de Elizabeth, em Cascais, correu de feição. As duas colegas conseguiram negociar um bom preço com um habitué. As sextas-feiras especiais, com ménages à trois, devem por isso repetir-se nos próximos tempos. Inexplicavelmente, as sextas eram até dias fracos para o negócio. "Temos de inovar todos os dias, senão..." Senão são ultrapassadas pela concorrência feroz.